Terça-feira, tarde quente e parada, ambiente tranquilo, poucas crianças. Depois de brincar um pouco com algumas delas, o tio resolve pegar um livro na estante pra ler. “Rob Roy”, de Walter Scott, foi o primeiro que o tio bateu o olho e parecia uma opção interessante. Começou a leitura daquela história, que iniciava falando de um jovem, cujos interesses estavam mais voltados para a literatura, mas cujo pai gostaria que ele seguisse a carreira comercial, tocando seu negócio – qualquer semelhança com a novela das oito, na Globo, não deve ser mera coincidência.
Estava uma leitura prazeirosa, ainda mais com o calor que fazia naquela tarde. Eis que, de repente, surge Sansão, o forte. Não, não é o da Bíblia, mas há lá suas semelhanças, como veremos. O tio o conheceu há alguns meses atrás, em ocasiões em que pôde presenciar a incrível energia deste garoto de uns dez anos, que mesmo em sua situação – ele tem câncer, brincava como ninguém, dando um trabalho danado para o tio.
Numa dessas ocasiões, numa festa organizada pela turma da brinque no dia da criança, havia um destes brinquedos infláveis enormes, que formam um ambiente com paredes de média altura e alguns bonecos no meio. Sobrou para o tio controlar a entrada, permitindo quatro crianças por vez. Com umas vinte crianças disputando o tal brinquedo, dá pra ter uma idéia do desafio… Para sorte do tio, as crianças estavam muito cooperativas e tudo transcorreu razoavelmente bem, exceto pelo nosso famoso Sansão, que não deixou o tio ter um segundo de descanso.
Se estava dentro do brinquedo, pulava de todo jeito, pra todo lado, e o tio tinha que redobrar a atenção. Quando estava fora, ficava tentando entrar pelas paredes. Depois de um tempo, começou a dar cambalhotas para fora do brinquedo, se apoiando nas paredes. O tio até que tentou convecê-lo de que isso não era assim uma boa idéia, mas não adiantava. Ele era o Sansão, afinal, e parecia querer deixar isso bem claro!
Bom, naquela tarde quente em que o tio lia, Sansão chegou de mansinho, falando baixo, poupando esforços. “Sansão perdera sua força?”, pensou o tio. Numa curiosa semelhança com o seu chará bíblico, os cabelos quase raspados indicavam que Sansão estava fraco. Resolveram, portanto, brincar de coisas mais leves, como montar umas casinhas, tentar jogar o tal do “vai-e-vem”, mas ele não estava à vontade, por conta de catéteres no braço e no peito. “Venha, então, que vou ler a história pra você”, disse o tio. “Num gosto de história não”, “Gosta sim, deixa eu ler que você vai gostar”, “Não, num gosto não”, e se despediu do tio.
O tio ficou olhando Sansão e pensando consigo, sobre a situação deste garoto. Fez um pedido: “Que ele possa ter tempo de aprender a gostar, meu pai”. Torceu também para que seus cabelos cresçam novamente e tragam de volta sua força (e a consequente preocupação para os tios, 🙂 ).
Sansão, o forte. Que assim seja.